abril 26, 2007

O 25 de Abril nos caminhos-de-ferro

Há 81 anos – assinalam-se no próximo dia 28 de Maio – o general Gomes da Costa liderou o golpe de estado militar que instaurou em Portugal a ditadura. Durante quase meio século, o país assistiu resignado aos sortilégios de um regime que lhe coarctou a esperança e a liberdade. O progresso e a felicidade. A alfabetização e a intelectualização.

Mais ou menos activas, o combate ao fascismo foi ganhando adeptos no interior de algumas organizações e classes sociais. Entre elas, a dos ferroviários. E quando se acabam de completar os 150 anos dos caminhos-de-ferro portugueses é, pois, inteiramente justo lembrar o contributo por aqueles dado para depor o regime fascista. Muitos deles pagaram-no com o próprio emprego. O despedimento era a punição para quem ousava discordar ou questionar as “virtudes” do Estado Novo. Afinal, o slogan com que Salazar inaugurou a fase da “ditadura nacional” era bem claro: “Tudo pela Nação, nada contra a Nação”.

Mais tarde, a revolução que restituiu a Portugal a liberdade também produziu efeitos no interior da Companhia dos Caminhos-de-Ferro Portugueses. Em 27 de Novembro de 1974, A. Carvalho da Fonseca, Director da Direcção de Pessoal da CP, assina o comunicado que anuncia a “reintegração na Companhia de agentes demitidos por motivos políticos”.

Nele se dão conta das condições de readmissão na CP daqueles agentes, estabelecidas na sessão do Conselho de Administração da empresa do dia 6 de Novembro de 1974, “após ouvidos os sindicatos”. Determinou-se, então, que “até 25 de Abril de 1975 a Companhia dos Caminhos-de-Ferro Portugueses integra nos seus serviços todos os agentes que foram despedidos por motivos políticos, desde que estes o requeiram, no prazo referido”. Para efeitos de antiguidade, o Conselho de Administração determinou que “o tempo de ausência da Companhia de tais agentes não é descontado”. Não existem referências quanto ao número de trabalhadores que foram demitidos nestas circunstâncias. Sabe-se, no entanto, que após a anexação de todas as linhas na CP, esta se tornou numa das maiores empresas portuguesas, com cerca de 25.000 empregados.

Para tornar esta readmissão o mais equitativa possível, a quarta cláusula previa o seguinte: “Os agentes despedidos são readmitidos para a categoria e classe que possuíam à data da demissão, ascendendo posteriormente à categoria e classe que lhes competiria, excepto se o acesso a essas categorias e classes estiver condicionado à prestação de provas de exame”. Nos casos em que tal sucedia, a readmissão dos agentes ficava “condicionada a revelarem a aptidão necessária para o desempenho das respectivas funções, avaliada através de exame médico”. Na eventualidade dos trabalhadores não possuírem “a aptidão necessária”, estava igualmente previsto que os agentes seriam readmitidos “para serviços adequados à sua capacidade física”, desde que tais categorias existissem na Companhia.

Na oitava e última cláusula dos princípios de readmissão na CP, o Director da Direcção de Pessoal fazia ainda saber que “os trabalhadores demitidos por motivos políticos e reintegrados na Companhia terão direito, no ano de entrada, a férias, subsídio de férias e Natal, e demais condições estabelecidas no Acordo Colectivo de Trabalho ou, entretanto, acordadas entre os sindicatos ferroviários e a Administração da Companhia”.

A reintegração dos trabalhadores despedidos por razões meramente políticas foi, sem dúvida, uma das maiores conquistas dos sindicatos ferroviários logo após o 25 de Abril. A partir daqui, e porque se tratava de uma classe capaz de fazer parar, com recurso a greves, um sector tão crucial como o dos transportes, nada voltou a ser como antes. As sucessivas administrações da CP, e até alguns governos, tudo fizeram para patrocinar o aparecimento de novos sindicatos no interior da Companhia. Era preciso “dividir para reinar”. E o certo é que a “estratégia” funcionou. Actualmente, existem cerca de três dezenas de sindicatos do sector ferroviário. Exceptuando o Sindicato dos Maquinistas (SMAQ), para o qual ainda hoje todos os sindicalizados disponibilizam mensalmente uma percentagem do salário para um fundo de greve, os restantes quase não chegam a ter expressão. As greves saldam-se, por isso, como frequentemente tem acontecido, em autênticos fracassos.

PAULO VILA

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