abril 27, 2007

A regra de três simples aplicada à viagem Braga-Faro em Alfa Pendular


Diz-nos a REFER, a propósito da entrada em vigor dos novos horários, que em 560 dos 690 quilómetros que separam as cidades de Braga e Faro “é possível praticar velocidades até 220 km/h”.
Pois bem! Temos então que 560x60:220=152. E sendo que 152 minutos equivalem a pouco mais de duas horas e meia, os restantes 130 quilómetros demoram a cumprir, de acordo com os horários da CP, quatro horas e vinte minutos (Braga-Porto, 40 minutos. Porto-Faro, 6h10m). Assim: 130x60:260=30. Ou seja, os restantes 130 quilómetros percorrem-se a uma média espantosa de… 30km/h. Sim, como no tempo áureo dos comboios a vapor!...
Chegam a ser comoventes estes anúncios, não chegam?

PAULO VILA

abril 26, 2007

O 25 de Abril nos caminhos-de-ferro

Há 81 anos – assinalam-se no próximo dia 28 de Maio – o general Gomes da Costa liderou o golpe de estado militar que instaurou em Portugal a ditadura. Durante quase meio século, o país assistiu resignado aos sortilégios de um regime que lhe coarctou a esperança e a liberdade. O progresso e a felicidade. A alfabetização e a intelectualização.

Mais ou menos activas, o combate ao fascismo foi ganhando adeptos no interior de algumas organizações e classes sociais. Entre elas, a dos ferroviários. E quando se acabam de completar os 150 anos dos caminhos-de-ferro portugueses é, pois, inteiramente justo lembrar o contributo por aqueles dado para depor o regime fascista. Muitos deles pagaram-no com o próprio emprego. O despedimento era a punição para quem ousava discordar ou questionar as “virtudes” do Estado Novo. Afinal, o slogan com que Salazar inaugurou a fase da “ditadura nacional” era bem claro: “Tudo pela Nação, nada contra a Nação”.

Mais tarde, a revolução que restituiu a Portugal a liberdade também produziu efeitos no interior da Companhia dos Caminhos-de-Ferro Portugueses. Em 27 de Novembro de 1974, A. Carvalho da Fonseca, Director da Direcção de Pessoal da CP, assina o comunicado que anuncia a “reintegração na Companhia de agentes demitidos por motivos políticos”.

Nele se dão conta das condições de readmissão na CP daqueles agentes, estabelecidas na sessão do Conselho de Administração da empresa do dia 6 de Novembro de 1974, “após ouvidos os sindicatos”. Determinou-se, então, que “até 25 de Abril de 1975 a Companhia dos Caminhos-de-Ferro Portugueses integra nos seus serviços todos os agentes que foram despedidos por motivos políticos, desde que estes o requeiram, no prazo referido”. Para efeitos de antiguidade, o Conselho de Administração determinou que “o tempo de ausência da Companhia de tais agentes não é descontado”. Não existem referências quanto ao número de trabalhadores que foram demitidos nestas circunstâncias. Sabe-se, no entanto, que após a anexação de todas as linhas na CP, esta se tornou numa das maiores empresas portuguesas, com cerca de 25.000 empregados.

Para tornar esta readmissão o mais equitativa possível, a quarta cláusula previa o seguinte: “Os agentes despedidos são readmitidos para a categoria e classe que possuíam à data da demissão, ascendendo posteriormente à categoria e classe que lhes competiria, excepto se o acesso a essas categorias e classes estiver condicionado à prestação de provas de exame”. Nos casos em que tal sucedia, a readmissão dos agentes ficava “condicionada a revelarem a aptidão necessária para o desempenho das respectivas funções, avaliada através de exame médico”. Na eventualidade dos trabalhadores não possuírem “a aptidão necessária”, estava igualmente previsto que os agentes seriam readmitidos “para serviços adequados à sua capacidade física”, desde que tais categorias existissem na Companhia.

Na oitava e última cláusula dos princípios de readmissão na CP, o Director da Direcção de Pessoal fazia ainda saber que “os trabalhadores demitidos por motivos políticos e reintegrados na Companhia terão direito, no ano de entrada, a férias, subsídio de férias e Natal, e demais condições estabelecidas no Acordo Colectivo de Trabalho ou, entretanto, acordadas entre os sindicatos ferroviários e a Administração da Companhia”.

A reintegração dos trabalhadores despedidos por razões meramente políticas foi, sem dúvida, uma das maiores conquistas dos sindicatos ferroviários logo após o 25 de Abril. A partir daqui, e porque se tratava de uma classe capaz de fazer parar, com recurso a greves, um sector tão crucial como o dos transportes, nada voltou a ser como antes. As sucessivas administrações da CP, e até alguns governos, tudo fizeram para patrocinar o aparecimento de novos sindicatos no interior da Companhia. Era preciso “dividir para reinar”. E o certo é que a “estratégia” funcionou. Actualmente, existem cerca de três dezenas de sindicatos do sector ferroviário. Exceptuando o Sindicato dos Maquinistas (SMAQ), para o qual ainda hoje todos os sindicalizados disponibilizam mensalmente uma percentagem do salário para um fundo de greve, os restantes quase não chegam a ter expressão. As greves saldam-se, por isso, como frequentemente tem acontecido, em autênticos fracassos.

PAULO VILA

abril 16, 2007

Nova tarifa já está… no lixo!

Assim que o Jornal de Barcelos denunciou o caso das cobranças ilegais de bilhetes por parte da CP, em Novembro de 2005, logo o Governo deu indicações à empresa para que identificasse e corrigisse “eventuais assimetrias” no tarifário. Para o efeito, em 7 de Dezembro desse mesmo ano, a CP nomeia uma equipa de trabalho e cria o chamado “Projecto Preço”, com a finalidade de proceder à “revisão da política tarifária”. É esta equipa que fica responsável por elaborar uma proposta para uma nova tarifa.
Em Março de 2006 e em Janeiro deste ano, na Assembleia da República, a secretária de Estado dos Transportes anunciou que até ao mês passado entraria em vigor a nova tarifa, onde já constariam “correcções” às “situações de discrepância que existem no tarifário”, como esta convencionou chamar-lhe.
Acontece que a dita tarifa não só ainda não está em vigor como já está, isso sim, no lixo! Fonte conhecedora do processo assegurou ao Jornal de Barcelos que Ana Paula Vitorino “mandou todo o Projecto Preço para o lixo”. “A nova ordem”, sabe-se agora, “é apenas e exclusivamente para reparar a questão de Barcelos”.
“E esta, hem?”

PAULO VILA

março 30, 2007

O zelo bacoco de alguns dos nossos autarcas

O atrevimento de alguns autarcas – sempre tão solícitos quando toca a exigir responsabilidades aos outros – conheceu por estes dias mais um episódio rocambolesco.
É-nos então dado a saber que a REFER, a empresa pública responsável pela gestão da infra-estrutura ferroviária nacional, recebeu no dia 9 de Março uma notificação da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia comunicando a posse administrativa de um edifício pertencente ao domínio público ferroviário.”
Mais hilariante ainda é o facto de “na mesma notificação” ter sido ainda “comunicada a decisão de proceder à sua demolição, o que teve lugar no passado dia 13 pela manhã.” Sem mais! A haver prédios devolutos a demolir, não há nada como começar por aqueles que… não nos pertencem. Mas que belo “ensinamento” aqui nos é transmitido pela Câmara de Gaia!...
É claro que, e muito bem, “tratando-se de um edifício do Estado [pena é que esta preocupação não se engrandeça também noutras circunstâncias], que se encontra sob gestão da REFER, esta avançou de imediato com as iniciativas judiciais que se impunham”. “Não só para responsabilização dos autores do acto por crime de abuso de poder”, lembra a empresa, “como, na vertente administrativa, para reposição da legalidade violada.”
Ora, de resto, este caso faz-nos lembrar um outro igualmente surrealista. O do presidente da Câmara da Trofa que ordenou que a REFER retirasse de imediato os postes de catenária entretanto depositados nos terrenos contíguos à estação quando se procedia à electrificação da linha do Minho até Nine, e dali para Braga, em 2004. Ainda hoje não percebo porquê, mas o que é certo é que logo a REFER tratou de pôr em marcha as supremas ordens do autarca.
Mas, que raio de legitimidade – qualquer que ela seja! – têm estes e outros autarcas para decidir sobre questões que, neste caso, são da estrita competência de quem tem a missão de “gerir a rede ferroviária nas suas vertentes de construção, conservação, manutenção, preservação do património e gestão de capacidades”? Não haverá quem ponha esta gente no sítio?

PAULO VILA

dezembro 21, 2006

A condenação da CP por acidente em passagem de nível

Entendeu a jurisprudência condenar recentemente a CP ao pagamento de uma indemnização por morte causada em acidente ocorrido numa passagem de nível. À época, ainda era a transportadora nacional quem geria a infra-estrutura ferroviária. Daí, esta condenação obrigar a CP e não a REFER, o actual gestor.
Em traços gerais, tal decisão resulta do facto, menciona o acórdão, de a referida passagem de nível não ter garantido ao automobilista um atravessamento em segurança. Ao que parece, por falta de condições de visibilidade. Note-se que este argumento já foi utilizado mais vezes em julgamentos de outros casos, mas nunca até então – pelo menos que eu saiba – fora fundamento para uma condenação da CP e/ou da REFER. E muito bem, ainda que essas absolvições tenham sido alicerçadas em factos diferentes daqueles que aqui pretendo partilhar. Nomeadamente, porque o comboio goza de “prioridade absoluta” nas passagens de nível.
Não devendo estar em causa, nesta como em situações semelhantes, o direito a indemnizações pecuniárias quando respeitados todos os procedimentos de segurança por parte dos automobilistas, importa pois saber quem verdadeiramente tem o dever de as pagar.
É um facto que a CP e as companhias que a antecederam não tiveram qualquer responsabilidade quando se construíram desenfreadamente milhares de passagens de nível por todo o país. Ainda há poucos anos, na linha de Guimarães, existia uma média de dez passagens de nível por quilómetro. Uma marca sem paralelo em qualquer outro país europeu. Em 1976, nos 3.570 quilómetros de linhas-férreas existiam cerca de 7.600 passagens de nível – uma média superior a duas PN/km. Mil e quinhentas eram públicas guardadas, 4.000 públicas desguarnecidas e 2.100 particulares.
Mas não obstante a perturbação e insegurança causadas às circulações por tão elevado número de atravessamentos, naquela mesma data a CP mantinha nos seus quadros de pessoal aproximadamente 2.000 guardas para guarnecer as 1.500 passagens de nível públicas. Ou seja, 7% dos efectivos da CP asseguravam tarefas que em nada beneficiavam o transporte ferroviário. Para além destes encargos, outros foram igualmente suportados pela CP sempre que surgiam novas passagens de nível públicas guardadas, uma vez que era necessário construir habitações e instalar cancelas.
E se os utilizadores da rodovia foram os únicos beneficiários desta incessante perversão, agora continuam a sê-lo desde o momento em que os sucessivos governos depositaram na CP, e mais recentemente na REFER, a responsabilidade quase exclusiva de suprimir em tempo recorde as passagens de nível. Na verdade, o Plano de Supressão de Passagens de Nível aprovado a 18 de Dezembro de 1997 determina que cabe à REFER, ex-Junta Autónoma das Estradas e autarquias locais desenvolverem acções conjuntas para eliminar estes atravessamentos. No entanto, “nos últimos cinco anos” foi a REFER quem “executou cerca de 97% das acções de supressão de passagens de nível”, lembra muito justamente aquela empresa.
Quer isto dizer que quem acumula maiores obrigações no sentido de reduzir o número de acidentes em passagens de nível optou antes pela sempre cómoda estratégia de “deixar que os outros o façam”. E esses, os que efectivamente não tiveram qualquer responsabilidade na implantação a esmo de milhares de passagens de nível, investiram nos últimos cinco anos 180 milhões de euros na supressão de 1.045 atravessamentos e na reclassificação de outros 295. Graças a este esforço financeiro, que deveria ter sido suportado por quem gere a rede viária e não a ferroviária, Portugal tem agora menos de uma passagem de nível por cada dois quilómetros de via-férrea – uma densidade já inferior à da União Europeia.
No entanto, quem julgou o caso apresentado no início deste texto não teve em linha de conta nada disto e, por conseguinte, errou duplamente. Por um lado, porque o pagamento da indemnização deveria de ser também suportado pelo município onde ocorreu o acidente e, caso se trate de uma estrada nacional, pela Estradas de Portugal. Pelo outro, como pode o Tribunal responsabilizar exclusivamente a CP por este acidente se já em 1930 – há 76 anos! – um decreto impedia que estrada alguma seria construída com passagem de nível?
Posto isto, quem, afinal, durante todos estes anos teve um comportamento negligente e irresponsável? Não é, pois, razoável a conclusão do Supremo Tribunal de Justiça quando este diz que “uma entidade, como o caminho de ferro, a quem é concedido o privilégio de prioridade absoluta nas passagens de nível, tem de assegurar que o cumprimento das regras de direito estradal de quem vai atravessar qualquer delas é suficiente para garantir uma travessia sem perigo de acidente".

PAULO VILA

novembro 27, 2006

Outra vez, não!

É do tempo em que porta-voz e presidente do Conselho de Gerência da CP – na altura, o cargo estava entregue a Crisóstomo Teixeira – eram dois e, simultaneamente, a mesma coisa. Nunca ninguém chegou a perceber onde acabavam as competências do primeiro e começavam as do segundo. A figura do porta-voz tinha, por isso, um papel meramente “higiénico” e as relações institucionais com a comunicação social atingiram o grau zero do despautério. Quem não se lembra das páginas de publicidade pagas inseridas em jornais nacionais onde se procurava desmentir o jornalista Carlos Cipriano?...
Ainda assim, ei-lo de volta! Carlos Madeira é novamente porta-voz da CP ou o que lhe queiram chamar, sendo que o problema não está no cargo mas naquele que o ocupa. A escolha de Cardoso dos Reis não podia ter sido mais infeliz.

Post scriptum: a chegada de Carlos Madeira à CP já começou a provocar os primeiros tumultos. Em breve, daremos notícias.

PAULO VILA

novembro 13, 2006

O jornalismo que por cá se faz

Leiam isto [seleccionar "Val e Mar - 02 de Novembro de 2006] e sintam vergonha do jornalismo que por cá se faz. E este caso é tanto mais grave quando o autor da pretensa notícia é, precisamente, o director do jornal onde esta “pérola” foi publicada.
A este e outros “exercícios literários”, certo dia Diana Andringa, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas, chamou-lhes “jornalismo de sarjeta”. Mas, para escritos como este, esta definição é já muito branda e excessivamente pudica. Porque, em boa verdade, isto é um jornalismo de…!

PAULO VILA