junho 09, 2006

E se tivessem a bondade de me dizer porquê

A edição do jornal Público de 5 de Junho último veio acompanhada de um suplemento inteiramente dedicado à REFER, cujo financiamento foi assegurado por um significativo número de empreiteiros e de outras empresas que dela dependem. Até aqui, nada de novo, é certo!
Miserável do ponto de vista gráfico e com um conteúdo propagandístico – repetindo-se por vezes, até! –, a abordagem que é feita em cada um dos assuntos nele contido deixa-nos, pelo menos, perceber uma coisa: o património desactivado vai continuar a não merecer os cuidados necessários e cada vez mais urgentes para a sua salvaguarda. Porém, para que se não diga que o assunto nem sequer foi abordado, o dito suplemento trás reproduzida na antepenúltima página a lenga-lenga do costume: “o sentido de utilidade pública e de desenvolvimento sustentável que a REFER procura dar à preservação do património colectivo aplica-se quer em linhas abertas ao tráfego de passageiros quer em canais desactivados”. No site da empresa, esta verborreia não varia muito: “quanto ao património edificado, é preocupação da REFER a implementação de soluções que permitam a sua reutilização e rentabilização por forma a que desempenhem novas funções úteis à comunidade”. Mas será que não há ninguém que, ao menos, reescreva esta patranha para não parecer tão mal? É que já são muitos anos a dizer e a prometer sempre o mesmo…
Em boa verdade, o que tem vindo a ser preservado ou acontece por inércia ou por iniciativa de um ou outro município consciente da importância de preservar a memória ferroviária. Ainda assim, a REFER continua a fazer-nos crer que está empenhada em “pôr termo à actual degradação/vandalização do património desactivado”. Só por brincadeira o dizem!... Tenho, para mim, que o gestor da infra-estrutura ferroviária tem tanta aversão pelo património desactivado como Mafoma tinha pelo toucinho.
Isto porque, exceptuando meia dúzia de casos, tudo quanto a REFER tem feito pela preservação e valorização do património edificado resume-se a emparedamentos de estações, apeadeiros e casas de guarda de PN. Nada mais do que esta vergonha! Em quase dez anos, a empresa responsável pela gestão da infra-estrutura ferroviária ignorou por completo o estado de perfeito abandono e de delapidação de um património magnífico. E nem sequer no ano em que se comemora o tricinquentenário dos caminhos-de-ferro portugueses merece alguma solicitude.
Posto isto, e socorrendo-me de uma das obras de Mário de Carvalho, deixo o desafio: e se tivessem a bondade de me dizer porquê!

PAULO VILA